De súbito desce mais intensa a melancolia da tua memória, uma saudade terrível, a tua imagem fugitiva. E de novo a súplica humilde - não morras, a violência da minha ternura. Quanto tempo tem a vida ainda para mim? E pensar que nunca mais estarás. É difícil. Nunca mais. É mesmo incompreensível e só ao fim de muitos anos é que se irá entendendo. E à medida que se entende fica a mágoa que se aceita. A tristeza apaziguada no cansaço e num certo retorno mental. No esvaziamento total de qualquer interesse, a não ser o meu amar-te, mesmo em vazio. Estou a ouvir a tua palavra oblíqua - que tolice. E todavia, vê tu, estou a ponto de construir no meu nada de tudo uma ideia de redenção com a memória de ti para esse nada que é meu. Está uma tarde sufocante, vou deixar que ela se cumpra na sua fadiga e o sol se apague na noite. Voltarei a escrever-te - voltarei?

Vergílio Ferreira, em Cartas a Sandra.