Tudo poderia ter sido apenas silêncio.
Deveríamos ter sonhado com mais força. 
até que as imagens do sonho
ficassem seladas como figuras totais
em qualquer parte do tabuleiro unânime. 
Deveríamos ter feito dos olhos 
um instrumento de música
,
para concentrar de outra maneira
os efémeros intervalos do nada.
Deveríamos ter convertido cada abraço
num grito único da matéria sem dono

e levado entre os dentes uma bandeira 
de despedidas,
quase como memória do que podia ter sido
como ondulante sinal de saudação.
E acima de tudo
deveríamos ter redefinido a morte

Mas tudo poderia ter sido apenas som.
Deveríamos ter recolhido a sombra 
das coisas

e tê-la guardado toda junta a um canto
do mundo,
para nela esconder a triste anormalidade
do pensamento. 

Deveríamos ter convertido o amor
num censo dos fundamentos 
do esquecimento,
para que só aí crescesse, 
como um estranho animal
que não ocupasse nenhum lugar no presente
e saltasse do passado para o futuro.
E deveríamos ter encolhido as palavras 
até as transformarmos em pedras neutras 
para pavimentar com elas o caminho impassível
ou atirá-las ao ar demasiado sonoro
como mãos suplentes do homem.
E acima de tudo
deveríamos ter redefinido de novo a vida.

Mas embora em ambos os casos 
teria o homem sido dispensado
de ser este sinal que nada entende
nem reconhece, 
a sua forma teria continuado a ser um sinal irónico
entre novas definições 
também seguramente tautológicas, 
da vida e da morte. 

Roberto Juarroz, em Poesia Vertical.

 


 


I lost my way again.

Porque estamos aqui?
Este não é o nosso lugar.
Haverá um lugar para nós
em algum outro sítio? 

Talvez nos defina,
como a luz do dia,
não ter lugar em sítio algum.
Mas também nos define a capacidade
De criar um lugar.

E só se encontra algo 
no lugar que se cria. 
Até encontrar-se em si mesmo,
se for possível encontrar-se.

Roberto Juarroz, em Poesia Vertical.

Aproxima-te. Preciso dos teus olhos acesos para não me despenhar no vazio. Para não ter frio.

Daniel Faria, em O Sétimo Dia.
Segue o teu caminho sem o temor de me perderes. Hás-de encontrar-me no regresso, mesmo que demores mil anos. 

Dulce María Loynaz, em Jardim de Outono.
Tanto tempo tive de alimentar a solidão com o meu sangue, que tenho agora medo de me achar sem sangue entre os teus braços... Ou de neles te encontrar menos do que te encontrava na minha feroz e ardente solidão. 
De tal modo te fundi nela e eu contigo, de tal modo lhe fui rendendo anseios, sonhos, gestos e sinais, que talvez o nosso encontro seja só o de duas nuvens no céu ou de dois desconhecidos na terra. 

Dulce María Loynaz, em Jardim de Outono. 

Enquanto fazes alguma coisa,
alguém está a morrer. 

Enquanto engraxas os sapatos,
enquanto odeias,
enquanto escreves uma carta cuidada
ao teu único, ou não único, amor

E ainda que pudesses chegar a não fazer nada, 
alguém estaria a morrer, 
tentando em vão juntar todos os cantos, 
tentando em vão não olhar fixamente 
para a parede. 

E ainda que estivesses a morrer,
mais alguém estaria a morrer, 
apesar do teu legítimo desejo
de morrer num minuto de exclusividade.
Por isso, se te perguntarem pelo mundo, 
responde simplesmente: alguém está a morrer.

Roberto Juarroz, em Poesia Vertical. 

chegamos a uma determinada altura das nossas vidas em que, subitamente, temos de escolher. E eu não posso dizer qual é a opção certa. “Peace or Love” é um pouco como ter uma mãe e um pai que nos dizem coisas diferentes e têm opiniões diferentes sobre o que é importante na vida. Depois crescemos e temos de saber, por nós próprios, que voz devemos ouvir em momentos diferentes. Não é propriamente um conselho, mas há uma altura em que temos de escolher entre paz e amor e ambos são muito importantes. E há algumas pessoas que escolhem paz e outras que escolhem amor. Não há uma escolha certa.

Entrevista aos Kings of Convenience. 

 


Patience is the hardest
Thing to have to learn
Hours seem like oceans
When desire burns
Rushing in will ruin all
You must bide your time
Sow a seed then water
Wait for love to grow
Love to you is given
Love is gifted you
No love can be taken
That love is not true
Love is pain and suffering
Love can be a lonely thing
Once you’ve known that magic
Who can live without it

Das coisas que salvam.

When you are old and gone away
Will you remember me today?


To be free is to belong.

 


Hay un suave murmullo
En el silencio de una noche azúl
Son dos enamorados
Que, encantados, gozan del amor.
Y ríe la vida y qué dice así: Ahh, ahh...
Y ríe la luna y qué dice así: Uhmm, uhmm...


In the middle of the night, some years back
You told your wife that you could not sleep
You said that you were scared to die
But you were curious to see the other side
Well, now you know
Now you know.
 

As feridas não desvalorizam a vida, antes a maturam, ampliam e aprofundam. 

José Tolentino Mendonça, no Expresso.
O facto de exigirmos sempre o mais elevado, o mais profundo, o mais fundamental, o mais extraordinário, onde só há o mais ínfimo, o mais superficial e o mais vulgar, torna-nos realmente doentes. Isso não faz progredir o ser humano, pelo contrário, mata-o. Vemos decadência onde deveríamos esperar progresso, vemos desespero onde deveríamos ter esperança, esse é o nosso erro, a nossa infelicidade. Exigimos sempre tudo onde, naturalmente, só se pode exigir um pouco, e isso deprime-nos. Queremos ver o ser humano no lugar mais alto, e ele logo resvala para a decadência; na verdade, queremos alcançar tudo e, realmente, não chegamos a nada. E, naturalmente, fazemos a nós próprios as maiores exigências, maiores do que tudo, e, ao fazê-lo, não tomamos na devida conta a natureza humana que não foi criada para estas exigências máximas, maiores do que tudo. O mundo sobrestima em geral o que é humano.
Falhamos sempre porque pusemos a fasquia muitos por cento mais alto do que é próprio para nós. E só vemos, se é que vemos, por toda a parte e para onde quer que o nosso olhar se dirija, falhados que puseram a fasquia alta de mais. Mas, por outro lado, digo a mim próprio, onde iríamos nós parar se puséssemos a fasquia sempre baixo de mais?

Thomas Bernhard, em Betão.
Há um poema de Raymond Carver
escrito quando enfrentava um cancro
que diz assim:

Conseguiste o que querias da vida?
Consegui.
E o que querias?
Poder dizer que me amaram.
Sentir-me amado neste mundo.

Chegar ao fim e dizer isto.
Vivemos uma vida inteira
à procura de dar uma resposta
igual.

d.m.
man never truly possesses anything
neither his strength, nor his weakness, nor his heart
and when he opens his arms his shadow is that of a cross
and when he tries to embrace happiness he crushes it
his life is a strange and painful divorce
there is no happy love

his life resembles those soldiers without weapons
who have been dressed up for a different fate
why should they get up in the morning
when night finds them idle, uncertain
say these words, my Life, and hold back your tears
there is no happy love

my beautiful love, my dear love, my tear
i carry you within me like a wounded bird
and those without knowing watch us pass by
repeat after me these words I braided together
which for your big eyes died straight away
there is no happy love

by the time we learn to live it’s already too late
let our hearts cry in unison at night
how much unhappiness it takes for the least song
how many regrets to pay for a thrill
how many tears for a guitar melody
there is no happy love

there is no love which is not pain
there is no love which does not bruise
there is no love which does not wither
and no greater than you the love for the country
there is no love which does not live from weeping
there is no happy love
but it is our love to the two of us
 
Louis Aragon, There is no happy love.
A melhor cura para o amor, como Ovídio já sabia, é o trabalho. Porém, agora o que o faz sofrer não é o tempo preenchido com um amor sem sentido, mas o tempo em si. O tempo tem de passar, mas também de não passar.

Jenny Erpenbeck, em Eu vou, tu vais, ele vai.