Seja qual for a forma em que é encontrada, a beleza é sempre uma excepção, sempre apesar de. É por isto que ela nos comove.
John Berger, em Porquê olhar os animais.
Enrique Vila-Matas, em Bartleby&Companhia.
Little poppies, little hell flames,
Do you do no harm?
You flicker. I cannot touch you.
I put my hands among the flames. Nothing burns
And it exhausts me to watch you
Flickering like that, wrinkly and clear red, like the skin of a mouth.
A mouth just bloodied.
Little bloody skirts!
There are fumes I cannot touch.
Where are your opiates, your nauseous capsules?
If I could bleed, or sleep! -
If my mouth could marry a hurt like that!
Or your liquors seep to me, in this glass capsule,
Dulling and stilling.
But colorless. Colorless.
Nenhuma imagem fixa é evidente porque a vida não está nunca nesse ponto técnico que a fotografia capta.
Se uma fotografia tivesse costas era aí que a vida estava.
A dinamite faz explodir coisas; já uma fotografia faz implodir uma narrativa veloz tornando-a uma simples posição estática.
Uma fotografia concentra e suspende, uma explosão espalha.
A fotografia de uma explosão é algo impossível.
Podemos tentar, mas quando se pára o movimento, o movimento desaparece.
E quando se pára a vida, a vida desaparece.
Gonçalo M. Tavares, no Expresso.
(como numa dança)
amanhã ou
se segurar
lá em cima,
Devemos ter cuidado com a forte ligação exclusiva a outra pessoa; não é, ao contrário do que por vezes se julga, prova da pureza do amor. Esse amor exclusivo, encapsulado, que se alimenta de si próprio, sem dar nada a terceiros nem qualquer preocupação com eles, está condenado a ruir. O amor não é apenas o nascer de uma paixão entre duas pessoas; existem infinitas diferenças entre apaixonarmo-nos e mantermo-nos nesse estado. Aliás, o amor é uma forma de estar, é algo que se «dá» e não um estado em que se «mergulha»; é um modo de nos relacionarmos com o mundo e não um gesto limitado a uma só pessoa.
Irvin D. Yalom, em A Psicologia do Amor.
talvez para sempre ― a casa e o cheiro dos livros,
a suave respiração do tempo, palavras, a verdade,
camas desfeitas algures pela manhã,
o abrigo de um corpo agitado no seu sono.
Guarda-o
serenamente e sem pressa, como eu nunca soube.
E protege-o de todos os invernos ― dos caminhos
de lama e das vozes mais frias. Afaga-lhe
as feridas devagar, com as mãos e os lábios,
para que jamais sangrem. E ouve, de noite,
a sua respiração cálida e ofegante
no compasso dos sonhos, que é onde esconde
os mais escondidos medos e anseios.
Não deixes nunca que se ouça sozinho no que diz
antes de adormecer. E depois aguarda que,
na escuridão do quarto, seja ele a abraçar-te,
ainda que não te tenha revelado uma só vez o que queria.
Acorda mais cedo e demora-te a olhá-lo à luz azul
que os dias trazem à casa quando são tranquilos.
E nada lhe peças de manhã ― as manhãs pertencem-lhe;
deixa-o a regar os vasos na varanda e sai,
atravessa a rua enquanto ainda houver sol.
E assim
haverá sempre sol e para sempre o terás,
como para sempre o terei perdido eu, subitamente,
por assim não ter feito.
Maria do Rosário Pedreira, em Poesia Reunida.
Não tenho tempo para isso.
Quem quer mudar o lugar do mundo actua como quem muda o lugar de um móvel:
empurra primeiro para um lado,
foi força demais,
empurra então para o outro lado,
agora com força de menos,
depois mais um pequeno toque para lá
e um ainda mais pequeno toque para lá,
e agora sim:
o móvel está no lugar.
Depois abrimos o móvel e vemos que os copos que estavam
lá dentro se encontram todos partidos. Estão a ver?
Os copos todos partidos. Que aborrecimento.
Não nos lembrámos da fragilidade do vidro.
Gonçalo M. Tavares, em O homem ou é tonto ou é mulher.
Maria Gabriela Llansol, em O começo de um livro é precioso.
I’m gonna take my trip. I’m gonna go back to Alaska again, because of some good memories. And, um, just do what I have to do. I have this book called Final Exit by Dr. Kevorkian. Some people call him Dr. Death. And it’s like, various ways that you can end your life if you need to. And, um, it’s kind of like a recipe. I have it, if I have to fall back on it for some ideas, but I’m not gonna spend any more time indoors in a hospital. No, thanks. … I’m gonna be 75 this year and I think I’ve lived a pretty good life. I’ve seen some really neat things, kayaking, all those places. And, you know, moose in the wild. A moose family on a river in Idaho. Um… And big, white pelicans landin’ just six feet over my kayak on a lake in Colorado. Or, uh… um, come around a bend, was a cliff, and find hundreds and hundreds of swallow nests on the wall of the cliff. And the swallows flyin’ all around. And reflecting in the water so it looks like I’m flying with the swallows and they’re under me, and over me, and all around me. And the little babies are hatchin’ out and egg shells are fallin’ out of the nests, landin’ on the water and floatin’ on the water. These little white shells. It’s like, well, it’s just so awesome. I felt like I’d done enough. My life was complete. If I died right then, that moment, it’d be perfectly fine.
Nomadland, de Chloé Zhao (2020)
que nos doem de verdade, e muito poucas
as que conseguem alegrar a alma.
E são também muito poucas as pessoas
que nos comovem o coração, e menos
ainda as que o comovem muito tempo.
No fundo, são pouquíssimas as coisas
que importam de verdade na vida:
poder amar alguém e que nos amem,
nunca morrer depois dos nossos filhos.
Amalia Bautista, em Conta-mo outra vez.