O meu bisavô parou. Os ponteiros do relógio não pararam nunca. Depois o meu avô parou. Os ponteiros do relógio não pararam nunca. Há-de chegar o momento em que eu pare. Os ponteiros do relógio continuarão a mover-se. 

António Lobo Antunes, na crónica "O Relógio"

Nothing's really happened like I thought it would.





Sondar
a linguagem das trevas
dormir
na neve dos limites
atravessar
flores distraídas

Decifrar
numa pedra fria
letras a arder
entrar
em comboios remotos
no olho gigante
das estações do fim do inundo

Ser
um sinal
lançado ao acaso na noite
deixar
noutra boca
o gosto de uma ausência

Temos tão pouco tempo
tão pouco sonho
tão pouco

Ernesto Sampaio, Poesia
Cuidado com a tua dor
É um pássaro que canta
Só para ti
E lá fora o mundo inteiro é surdo

Jila Mossaed (1948)
Protege-nos e guarda o que fomos.
O que nunca ninguém encontrará:
tectos onde deixámos olhares de dor,
vozes que ficaram, caladas, nas paredes.
A casa organiza o futuro esquecimento.
De súbito, uma corrente de ar e uma porta
fechando-se com uma pancada seca, como um aviso.
Somos cada uma a sua casa, a que para si ergueu.
E que no fim fica vazia.

Joan Margarit, em Animal de Bosque
quando nos sentamos juntos, as palavras que dizemos fundem-nos um no outro.

Virginia Woolf, em As ondas 
Mas a solidão é que é sempre considerada um castigo:
Assusta tanta gente. E, no entanto, o monstro
está na multidão

Joan Margarit, em Animal de Bosque
basta-me saber que em teoria tu me podes ouvir mesmo que na realidade não ouças não preciso de mais, basta sentir-te aí ao alcance da minha voz e se for preciso para o que der e vier. 

Samuel Beckett, em Dias Felizes

As canções da Terra (2013), produzido por Wim Wenders e Liv Ullmann